sábado, 8 de novembro de 2008

DEMOCRATIZAÇÃO DO ENSINO DA MATEMÁTICA

CORRELATO DE EXPERIÊNCIA

A matemática tem sido significativamente considerada uma das áreas mais complexas dentro da escola e, por isso, é considerada a vilã no sistema de ensino, temida pelos alunos e pelos professores.
Uma das explicações mais evidentes e discutidas sobre esse assunto é constatada por Lins (2004), que expõe que há um estranho distanciamento entre a matemática acadêmica e a matemática da rua, ou seja, a escola não leva em consideração o que o aluno sabe e cria um monstro de fórmulas incompreensíveis sem ao menos mostrar de onde vieram.
Sobre isso pode-se dizer que

O ensino de matemática se faz, tradicionalmente, sem referência ao que os alunos já sabem. Apesar de todos reconhecermos que os alunos podem aprender sem que o façam na sala de aula, tratamos nossos alunos como se nada soubessem sobre tópicos ainda não ensinados (CARRAHER, 2001).

Isto caracteriza o fato de que a escola, ainda trabalhando de modo tradicional e restrito, ajuda a perpetuar a realidade desvinculada entre o que se aprende dentro dela e o que se vive no contexto da comunidade, fator este que serve como ponto desestimulador para a aprendizagem dos conteúdos, principalmente na área da matemática, fazendo perpetuar a idéia de esta é uma área difícil e inerente somente a poucos gênios.
Quando se fala em escolas regulares essa realidade já é complicada, visto que ainda há uma série de incoerências quando se trata do ensino nessa área, no que diz respeito a escolas que atendem alunos portadores de deficiência percebe-se que a situação muitas vezes é ainda mais crítica.
Destaca-se aqui neste momento as palavras de FONSECA (1995, p. 9), que expõe que o indivíduo portador de necessidades especiais ou deficiente é

(...) uma pessoa com direitos. Existe, sente, pensa e cria. Tem uma limitação corporal ou mental que pode afetar aspectos de comportamento, aspectos estes muitas vezes atípicos, uns fortes e adaptativos, outros fracos e pouco funcionais, que lhe dão um perfil intra-individual peculiar. Possui igualmente discrepâncias no desenvolvimento biopsicossocial, ao mesmo que aspira a uma relação de verdade e de autenticidade e ainda a uma relação de coexistência conformista e irresponsável.

Diante disso percebe-se a necessidade de ver os portadores de deficiência como pessoas capazes e que as vezes apenas se faz necessários algumas adaptações para que possam atingir seus objetivos e é no que se pensou no desenvolvimento desse trabalho que busca levar ao alcance de todos a compreensão dos conteúdos matemáticos que constam nos currículos escolares.
Para a realização deste trabalho foi organizado um grupo de acadêmicos que tinham disponibilidade de trabalhar nas terças-feira e sextas-feira à noite. As aulas foram ministrada na APASFI (Associação de Pais e Amigos e Surdos de Foz do Iguaçu).
Essa associação surgiu em 1982 e seu objetivo é trabalhar com as dificuldades dos alunos com deficiência auditiva ( surdos ) que freqüentam as aulas regulares. Assim, os alunos com deficiência auditiva (surdos), freqüentam o ensino regular e em contra turno obtém auxílio escolar ofertado pelos professores da APASFI, sendo que os alunos que foram atendidos nesse projeto, na sua maioria, freqüentam a modalidade de ensino denominada E.J.A ( Educação de Jovens e Adultos). Como essa modalidade é desenvolvida por módulos, os alunos participavam das aulas ministradas pelos acadêmicos no dias em que não tinham aula, ou seja, na terça e sexta.
Um dos principais problemas encontrados pelos acadêmicos envolvidos no projeto foi o da comunicação, apesar de todas as salas terem interprete se faz necessário que os acadêmicos conheçam o mínimo da língua utilizada pelos surdos que é a LIBRAS . Entre os acadêmicos havia uma que já tinha participado do projeto no ano anterior e motivada com esse contato resolveu fazer o curso de LIBRAS, desta forma pode-se ter um contato mais direto com o aluno surdo.
Os acadêmicos preparavam as aulas a serem trabalhadas no Laboratório de Ensino de Matemática (LEM – Foz) que funciona na Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, campus de Foz do Iguaçu, esse laboratório foi criado em 1999. As atividades desenvolvidas pelos acadêmicos tinham como aspecto fundamental atender as sugestões dos Parâmetros Curriculares Nacionais onde consta que:

o ensino da Matemática prestará sua contribuição à medida que forem exploradas metodologias que priorizem a criação de estratégias, a comprovação, a justificativa, a argumentação, o espírito crítico, e favoreçam a criatividade, o trabalho coletivo, a iniciativa pessoal e a autonomia advinda do desenvolvimento da confiança na própria capacidade de conhecer e enfrentar desafios (PCN, 1997).

Vista dessa forma a matemática tem como função abrir caminhos para o desenvolvimento de habilidades que são necessárias às outras áreas do conhecimento, o que faz com que seja necessário muito empenho no trabalho com os alunos da APASFI.
Foram três meses de trabalho intenso, nos quais os alunos foram tirando suas dúvidas com os acadêmicos e nessa relação percebeu-se que, aos poucos, os alunos iam perdendo o “receio” de fazer tentativas, de buscar soluções, de estimar resultados, enfim, começaram a ter maior segurança naquilo que faziam, principalmente por estarem compreendendo aquilo que estavam resolvendo.

RESULTADOS OBTIDOS E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Segundo DROUET (1995), todos devem desenvolver uma atitude mais aberta em relação aos deficientes, deixando-se de lado o preconceito.
Observou-se neste trabalho que a aprendizagem efetiva dos conteúdos matemáticos é possível a todos, basta que o professor consiga perceber as necessidades do seu aluno e faça as adaptações necessárias para que este compreenda e assimile o conhecimento que está sendo trabalhado.
Na concepção de D’Ambrósio (2006), o grande desafio da matemática é desenvolver um programa dinâmico na escola, apresentando essa ciência de hoje relacionada a problemas de hoje de modo que seja interessante para os alunos. Ou seja, a matemática necessita ser assumida como uma área que trata, além de números e cálculos, da formação das estruturas básicas que auxiliam o sujeito a sobreviver e a transformar a sociedade do qual faz parte.
Inclusive, destaca-se que o próprio aluno, conforme observado no projeto, tem a preferência por situações de aprendizagem dos conteúdos matemáticas nas quais lhe é possível compreender não só as fórmulas, mas conhecer também o contexto que originou a necessidade de criação deste ou daquele conceito.
Diante desse trabalho de curto prazo, na verdade, foi possível perceber claramente que, quando os alunos são atendidos em suas características individuais, todo o aprendizado é possível. Com o andamento do projeto os alunos conseguiram sanar as principais dificuldades com relação aos conteúdos matemáticos e, principalmente, passaram a ver a Matemática como um conjunto de conhecimentos possível de ser aprendido por todos, pois ela é parte do cotidiano de cada um. Enfim, a Matemática precisa estar ao alcance de todos e a democratização do seu ensino deve ser meta prioritária do trabalho docente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares Nacionais: matemática. Brasília: MEC/SEF, 1997.
CARRAHER, D;CARRAHER T; SCHLIEMANN, A.Na Vida Dez NA Escola Zero.11 ed.São Paulo:Cortez,2001.
D’AMBRÓSIO, U. Educação matemática: da teoria à prática. 13 ed. São Paulo: Papirus, 2006.
DROUET, R. C. R. Distúrbios da aprendizagem. São Paulo: Ática, 1995.
FONSECA, V. Educação especial – programa de estimulação precoce, uma introdução às idéias de Feurstein. Porto Alegre: Artmed, 1995.
GRUPO DE APOIO AO ESTUDANTE COM DEFICIENCIA (GAED). Quem somos? Disponível em: «http://prograd.ufpr.br/~pne/quemsomos.htm» . Acesso em: 12/03/07.

LINS, R. C. Matemática, monstros, significados e educação matemática. In: BUCUDO, M. A. V. ; Borba, m. D.W c. (orgs). Educação Matemática: pesquisa em movimento. São Paulo: Cortez, 2004, p. 92-120.
SASSAKI, R. K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.
WERNECK, C. Ninguém mais vai ser bonzinho na sociedade inclusiva. Rio de Janeiro: WVA, 1997.

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